30 de mar. de 2011

Universalismo ,melindre e escolhas


Universalismo, melindres e escolhas
Dalton Roque
Nós escolhemos muito. Ficamos melindrados por pouca coisa. Falamos do
ego dos outros sem observarmos o próprio. Heterocrítica afiada,
autocrítica cega.
Intelectualidade elevada, sentimento opaco. Muitas
opiniões, poucos valores. De um lado, grande adequação e senso
sociais. No outro extremo, discernimento consciencial quase nulo.
Fazemos pouco pela humanidade. Pelo pouco que fazemos a ela nos
sentimos grandes, credores de um rosário de favores. Nossas verdades
pessoais são "relativas" e "lúcidas". As verdades
alheias, "absolutas" e "primitivas" .Julgamo- nos universalistas sem,
contudo, enxergar a pedreira de facciosidade que nos oprime as
costas. Dizemos que compreendemos os outros, mas voltamos para casa
em silêncio, imersos em pensamentos de crítica ferina, muitas vezes
gratuita, desnecessariamente severa. Somos "pretos" falando
de "brancos", "brancos" falando de "índios". Cínicos a exigirem de
outrem pureza de sentimentos. "São caboclos querendo ser ingleses",
diria Cazuza.
Falamos de fraternidade, porém nos ressentimos por qualquer coisa.
Falamos de ego, todavia não arredamos o pé da posição doutrinária,
intelectual ou institucional. Falamos de humildade sem vislumbrá-la
ou vivenciá-la. Confundimos a verdadeira humildade (simplicidade
d'alma) com cordialidade protocolar (politicamente correto).
Confundimos sinceridade com orgulho da própria rudeza. Somos farinha
do mesmo saco. Humanos, terráqueos, chame do que quiser.

Cada qual com sua verdade, com sua "salvação", com sua ortodoxia,
inarredável e intransigente, discreta ou escancarada – seja na
alimentação, na doutrina, na filosofia, na ecologia, ostentamos o
carvalho inflexível, "cheio de razão". Quebra mas não verga. Nossos
amparadores (guias, mentores, benfeitores espirituais) assistem a
tudo, serenos e compassivos. Somos os karmas negativos deles.

Os amparadores de ocasião (espíritos amigos mais densos como nós) se
aborrecem e se retiram, para voltarem mais tarde. Os verdadeiros
amparadores não julgam, não olham nossa longa lista de defeitos,
negligências e teimosias. Se eles pudessem, escolheriam gente melhor
para ser amparada – nos descartariam com toda a razão. Mas eles são
aprendizes do amor e o amor não descarta, não julga, não humilha e
nem se ofende.

Olham-se nos olhos os amparadores dos dois companheiros que divergem.
Imbuídos de compaixão, ambos os amparadores fitam seus amparados,
enquanto estes defendem seus pontos de vista com paixão, ou seja,
passando longe do universalismo, ignorando pontos de convergência que
saltam aos olhos. Tentam intuir o universalismo, a síntese e a
flexibilidade em seus corações – como bola de ping-pong, bate e volta
naquelas cabeças duras e corações frios.

Quando os pontos de vista são polêmicos, então nem se fala –
homossexualismo, adoção, vegetarianismo versus carnivorismo,
mediunismo versus animismo, clonagem, embriões, aborto, eutanásia,
distanásia, suicídio, viagem astral, etc.

Somente o vôo da alma leve e da consciência sem grilhões enxerga a
visão de conjunto tão difícil às mentes ortodoxas e condicionadas,
embora às vezes cultas, intelectualizadas, bem-articuladas e até
parapsíquicas.

Universalismo não é salada mística, colcha de retalhos, ecumenismo
doido, buscador-borboleta, nem sincretismo contraditório.

Universalismo significa, antes de tudo, flexibilidade da mente e do
coração. Percepção aguda de nuanças conscienciais sutis. Entendimento
de paradoxos. Distinção entre paradoxos da natureza e contradições do
comportamento humano. Autoconhecimento das próprias limitações.
Respeito às limitações alheias. Compreensão de que existe o Relativo
e o Absoluto, de que o relativo não é murismo, leviandade ou
indecisão. Ciência de que humildade não é ignorância, doença moral,
pobreza financeira ou personalidade fraca, mas estado consciente de
modéstia pro-ativa, com auto-estima inteligente, depurada da
arrogância e da vaidade patológicas.

Universalismo reflete amplitude de raciocínio – maturidade suficiente
para perceber que, às vezes, há mais exceção do que regra, além de
muitos "senões" e "porquês".

Em suma, nós escolhemos muito. Com o dedo em riste, descortinamos as
falhas alheias, enquanto nossos amparadores nos toleram, observando-
nos a disparar dardos retóricos e bioenergéticos, de quem se
sente "cheio de razão".

Os que procuram o autoconhecimento sincero e tentam tomar as rédeas
de seu ego ganham apoio extrafísico elevado, oriundo de amparadores
universalistas, espíritos cônscios de que ninguém é perfeito,
principalmente na Terra, educandário de "peças raras". Entretanto, os
mais recalcitrantes e teimosos permanecem vinculados ao manicômio
terráqueo das dores e sofrimentos humanos – um estabelecimento
mais "barra-pesada" que a escola-reformató rio planetária.

O livre-arbítrio é um fato e uma opção consciente. Sem humildade não
há universalismo. A cabeça pode estar cheia, mas o peito está vazio.
A mente pode conhecer, mas só o coração pode saber (sabedoria).

Você não tem de se curvar a ninguém, mas terá de se curvar às Leis
Naturais, pois o relativo está contido no Absoluto.

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