Mulher, negra e pobre. Venci
Perdi empregos por ser favelada
Mulher, negra e pobre, venci na vida
DONA DA HISTÓRIA
Maria Cristina Paixão, 33 anos, advogada, São Paulo
Driblei o destino que me era dado como certo, abri meu
próprio negócio e saí da favela
Nasci numa família de cinco irmãos, na favela do Jardim
Maria Estela, em São Paulo. Meu pai era pedreiro e minha mãe empregada
doméstica. Cresci vendo os dois se matarem de trabalhar sem construir nada.
Minha mãe é uma lutadora, eu sempre quis ter a força dela, mas não o mesmo
destino.
As minhas amigas, como quase todo mundo que vive na favela,
não tinham perspectiva de vida e com 14 anos já estavam grávidas, trabalhando
como faxineiras e babás, coisas que pra mim eu não admitia. Elas me julgavam
prepotente, riam de mim. "Você sonha demais. O mundo nem olha pra gente.
Acorda!" Mas eu sabia que podia. Decidi contrariar todas as estatísticas e
mudar o meu destino.
Perdi empregos por ser favelada
Sempre estudei em escola pública e, aos 14 anos, fiz um
curso de técnico administrativo para poder trabalhar. Passei num teste num
escritório de contabilidade e trabalhava durante o dia e estudava à noite. Nos
finais de semana distribuía panfletos nos semáforos.
Mesmo com dois empregos, o dinheiro não dava. Então fiz um
curso de contabilidade pra ganhar mais. O curso era particular, mas consegui
pagar.
Formada, fui procurar empregos melhores. Eu tinha 19 anos e
participei de seleções em duas grandes empresas financeiras. Como o contador
lida com muito dinheiro, é comum que os avaliadores visitem a casa dos
candidatos pra saber se moram em locais que ofereçam riscos à empresa.
Na primeira seleção cheguei até a reta final, mas, quando
disse à psicóloga que morava na favela, ela explicou que a empresa não poderia
me admitir. Não desisti.Nem mesmo quando a mesma coisa aconteceu em outra
seleção, de um jeito velado.
Dizem que o negro é quem mais sofre preconceito, mas
favelado sofre ainda mais. Naquela época aceitei a minha condição resignada. Eu
achava que favelado não tinha direitos. Se fosse hoje,teria rodado a baiana.
Saí da empresa e abri meu próprio
negócio
Por ter sido vítima de preconceito a vida inteira, eu sempre
tive vontade de fazer direito para conhecer as leis. Fui atrás de bolsas e
segui em frente.
No segundo ano da faculdade, em 1999, arrumei um trabalho
num escritório. Para complementar o orçamento, atendia alguns clientes em
casa.Quando já tinha uns dez clientes, vi que ganhava com eles mais ou menos o
meu salário no escritório. Então resolvi trabalhar só em casa.
Meu namorado era funcionário de uma empresa que precisava de
serviços contábeis e me indicou.Quando fechamos o negócio, eu tive coragem de
alugar uma sala. Só uma amiga, a Carla, fazia as vezes de funcionária.
Comprei um computador a prestação e, como não tinha dinheiro
pra linha telefônica, a gente usava telefone público. Dividíamos a mesma sala e
comíamos a marmita de casa. Até serviço de office-girl a gente fazia!
O negócio foi dando certo e o escritório cresceu. Aluguei
uma sala ao lado, contratei a Carla e outros funcionários e comprei mais dois
computadores. Quatro anos depois, em 2003, ano da minha formatura na faculdade
de direito, vim para o meu atual escritório.
Saí da favela!
Hoje eu tenho 150 clientes e oito funcionários. O escritório
fatura R$ 20 mil por mês, bem mais do que os R$ 1 mil que eu ganhava
trabalhando para os outros. Tenho um carro já quitado e casa própria
financiada.
Meu negócio deu tão certo que fui a segunda colocada no
Prêmio Mulher Empreendedora do Sebrae, com certeza uma das maiores emoções da
minha vida. Foi o reconhecimento do meu esforço.
Agora só falta eu terminar a pós-graduação em direito
processual civil para começar o meu mestrado e realizar mais um sonho, o de dar
aula. Mas isso fica pra uma outra história.
http://www.marciosilva.xpg.com.br/5.html
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