25 de out. de 2014

A CARTA PARA GUARDA-JÓIAS

A CARTA PARA GUARDA-JÓIAS

Querida Amor

Vou te escrever esta carta para te dizer que não entendo porque queres que te escreva uma carta. Há anos que a memória já deixou de registar escrevi-te muitas cartas, milhares delas, estão todas fechadas tal como tas entreguei. Guardaste-as todas no teu guarda-jóias, ao abono da verdade, de guarda-jóias só têm o nome e as minhas fechadas e virgens cartas de amor. Cartas que tive que escreve-las e decorar tudo que nelas escrevi, pois querias saber o que estavam escritas sem as abrir. Graças a Deus quase todas eram de pequenos poemas de amor. Embora o “amor” seja uma palavra apenas e com quatro letras tem muito que se imaginar e dizer sobre ele alguns dos poemas são tão ou quase iguais aos anteriores, não era difícil “ler” uma carta fechada. Naquele tempo compreendia, éramos namorados e jovens, tínhamos o tempo e os sonhos mil e nada parecia terminar. Víamos os nossos entes queridos envelhecidos, mas pensávamos que seriamos eternos jovens e éramos os donos do tempo.
Hoje é diferente, muito diferente. A poesia dos jovens apaixonados desapareceu com a idade, as palavras perderam os floreados que nunca viste, pois as cartas que te enviei continuam guardadas no guarda-jóias, virgens e seladas. Hoje existe a internet, onde vais sempre que o tempo, o tempo escasso que tens, te permitir e podemos “chatar” para não chatearmos com a vida e a velhice. Tu no teu portátil ou “Iped” ou “tablet” e eu no meu, ambos na mesma sala e muitas vezes na mesma poltrona. Num silêncio total e absoluto como se de dois mudos nos tratássemos. Falamos um com o outro, contamos piadas e falamos dos nossos projectos… Uns realizáveis, outros apenas sonháveis, como o meu de ganhar no lotaria e comprar-te muitas jóias para colocares no guarda-jóias e tu sempre respondes a mesma coisa, não vou repetir, pois sei que vais me dizer de novo pelo menos mil vezes mais hoje.
Tudo está diferente, vejo-te na câmara e escrevo que és linda e tu me respondes, as vezes, te piso, estamos lado a lado e falamos no “Skipe”… Não escreves, gritas -Estas sempre a pisar-me! Sinto-me feliz e peço-te desculpa, mas como estou feliz, tudo parece falso, e com raiva sai uns impropérios e eu feliz por acabar de saber que ainda falas, não estás muda… Não respondo, sei que tens razão. O que não tens razão é no:
-Tu já não me amas, há muito que não recebo nem uma carta tua!
As vezes acontecem mais uns insólitos, o som característico que alguém enviou-me uma mensagem. O ciúme é humano, tu sentes o mesmo que eu sinto quando acontece o contrário, seres tu a receberes aquele som. Actuamos de maneira diferente, mas o ciúme deve ser igual.
No meu caso sempre pergunto para que queres que te envie uma carta? Alias escrevo no “chat” ou melhor “chato” chateado. E tu respondes que é para colocares no guarda-jóias. E eu ingénuo te pergunto porque não colocas jóias no guarda-jóias e tu me respondes que as tuas jóias sãos as cartas de amor que permanecem invioladas e virgens que te escrevo. Imagino que um dia hás de as ler, mas não sei quando será.
Quando estou fora ou tu estás fora de casa ou de país seja por motivos de trabalho ou de férias ou, infelizmente começa a ser frequente, de saúde falamos todos os dias, uma, duas, três vezes ou mais. Aliás sinto falta de ti sempre que estivermos separados há mais de dois metros de distância, mas nada justifica escrever-te cartas de amor cheios de floreados, se elas são para serem guardadas seladas… Ou talvez exista? Sim prometo vou te escrever sempre que quiser te oferecer uma jóia.
Ao terminar esta carta vou te dizer que te amo e que vou te escrever uma carta de amor em poesia. Prometo e juro que vou me inspirar e te fazer um poema.
Sei que é uma promessa que tu nunca saberás que eu fiz, pois sei que esta será mais uma jóia no teu guarda-jóias cheio de cartas de amor por abrir.

PS- Estava quase a esquecer que tu sempre exiges com eu coloque na carta a data, o local onde foi feito e o meu nome, não entendo porque tenho que por o nome… Enfim… Esta carta foi escrita por mim, João Furtado no dia 25 de Outubro de 2014, em Lem Ferreira, cidade da Praia e destina-se a minha querida que adora receber cartas para as guardar no guarda-jóias.

   
João P.C. Furtado
http://joaopcfurtado.blogspot.com

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